16 de outubro de 2012

Debate: "O juiz S&M", em 6/10/12

Delci Rosa Sales
Participantes do debate
O prof. Luis Augusto Borges, da FESPSP
Conrado Krainer
Em primeiro plano, o prof. Borges, debatedor convidado
Os presentes ao debate

Nossa próxima atração: "Koyaanisqatsi", em 20/10/12

CINECLUBE DARCY RIBEIRO apresenta Koyaanisqatsi (Koyaanisqatsi, 1982, EUA, 86 min, cor)
Direção: Godfrey Reggio. Roteiro: Godfrey Reggio, Ron Fricke, Michael Hoenige, Alton Walpole. Fotografia: Ron Fricke. Montagem: Ron Fricke, Alton Walpole. Música: Philip Glass. Documentário.














Em 12 de maio de 1982, o crítico Frank Eskenazi escreveu no jornal francês Libération:

Koyaanisqatsi: os Estados Unidos de fora a fora no choque das imagens

Produzido por Francis Fird Coppola, o filme de Godfrey Reggio afronta a atual produção videográfica

Não há nada em Koyaanisqatsi além de música e imagens, em condições tais que o filme chega a ser doloroso, mas o espectador, embora consternado, hesita em se render.
Por trás de um título incompreensível, há um dos projetos mais alucinantes da história do cinema. Godfrey Reggio o criou e dedicou boa parte de sua vida à realização de desse imenso afresco místico e fantástico.

A expressão ‘Koyaanisqatsi’ vem da linguagem dos hopis, a mais antiga das tribos indígenas nos EUA. A tradição remete à ‘vida louca, desequilibrada e que caminha para a desintegração’ do mundo moderno. Trata-se de uma velha denúncia: o homem se perde ao destruir sua própria matriz. Ao cortar o cordão umbilical com a mãe natureza, ele constrói para si um mundo sem espírito no qual não é mais que um autômato desencarnado.
Mas Koyaanisqatsi é espetacular pelo inusitado das imagens. Aliadas à trilha sonora de Philip Glass, o mestre da música modular, constituem o valor do filme.

Os EUA são o pano de fundo exclusivo de um quadro vivo que se desenvolve em duas partes. O filme começa com impressionantes travelings de paisagens norte-americanas, dos céus dos Estados Unidos, da imensidão de suas cores de sua arquitetura natural. A segunda parte é um incrível mergulho na cidade de Nova York, aprisionada dentro daquilo que lhe dá sua beleza, mas também sua desumanidade.”

A imagem como a mais indubitável forma mediadora da emoção

“Reggio precisou de sete anos de filmagem e mais quatro de montagem para realizar este filme produzido por Francis Ford Coppola, que certamente anteviu um projeto delirante capaz de igualar sua própria megalomania. Koyaanisqatsi é, antes de tudo, uma grandiloquente celebração da imagem como a mais indubitável forma mediadora da emoção. Suas imagens se entrechocam e reconstroem o mosaico de um mundo que, enfim, é imaginário.

A câmera de Reggio colocou-se um pouco em todos os cantos, sem nunca pretender mostrar as coisas. Poucas sequências em tempo real, mas muitas em câmera lenta ou acelerada decupam de modo minucioso e alegórico o ambiente norte-americano. Aos poucos, a trama exclusivamente pictorial do filme mergulha o espectador em um estranho lirismo.
Cenas chocantes? Sem dúvida, mas não só isso. O conjunto do filme — se pusermos de lado sua filosofia incomum e pretensiosa (então os hopis previam tudo isso?) — mostra um espetáculo raro que desafia e zomba de toda a atual produção videográfica.”

Veja aqui um trailer do filme.


Data: sábado, dia 20 de outubro de 2012
Hora: 13h
Local: Sala Florestan Fernandes (r. General Jardim, 522, Casarão, próximo à estação República do metrô)

2 de outubro de 2012

Nossa próxima atração: "O juiz S&M", em 6/10/12

CINECLUBE DARCY RIBEIRO apresenta O juiz S&M (SM rechter, 2009, Bélgica, 90 min, cor)
Direção: Erik Lamens. Roteiro: Gene Bervoets, Veerle Dobbelaere, Axel Daeseleire. Fotografia: Stijn Van der Veken. Montagem: Ewin Ryckaert. Música: Ivan Georgiev. Elenco: Gene Bervoets, Veerle Dobbelaere, Axel Daeseleire e outros.

Moral pública versus amor privado

“No início de 1997, Koen Aurosseau era um respeitado juiz na corte de primeira instância em Mechelen (cidade na província de Antuérpia, na Bélgica). No fim desse mesmo ano, foi acusado de agressão física e incitamento à prostituição, levantando um escândalo cujos respingos se espalharam pelos jornais. Koen logo foi condenado, perdeu o posto e mergulhou em depressão material e emocional, perdeu a casa e tentou suicídio. Sua mulher, Magda, que se sentia responsável por levá-lo a essa confusão, sempre esteve a seu lado.

Pois fora Magda quem pedira a Koen, cinco anos antes, que explorasse com ela os limites sexuais e que visitasse um clube sadomasoquista. O sadomasoquismo consensual entre adultos não é ilegal, mas, quando a vida privada do casal tornou-se de repente pública, a promotoria entrou em cena.
Sexo, política, vingança e segredos combinaram-se para fazer desta história uma rica narrativa. O juiz S&M é o longa-metragem de estreia do diretor flamengo Erik Lamens. ‘Pensei durante muito tempo antes de fazê-lo. Era um projeto arriscado, e foi difícil encontrar a perspectiva certa’, disse Lamens.
Talvez nunca a tivesse achado se o próprio juiz não o tivesse procurado. Na véspera de seu encontro, a apelação de Koen fora rejeitada pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos, e Lamens havia decidido abandonar o projeto. Mas Koen convenceu-o a mudar de ideia. ‘Eu precisava de um ângulo pessoal’, lembra Lamens. ‘O que víramos nos jornais e na TV, 12 anos antes, era uma visão do exterior, e eu queria chegar ao interior.’

Quando o caso estourou, Magda ficou em segundo plano, com toda a atenção que seu marido recebia. Ele dava entrevistas; ela se calava. Em O juiz S&M, Lamens focalizou-a mais. ‘Tudo começou com uma crise conjugal. Por causa da depressão dela, eles estavam à beira do divórcio. Então, ela lhe contou algo que escondera por 30 anos. E ele disse “se isso te fizer bem, vamos tentar”.’ Lamens acha que isso é o ponto central da história. ‘Isso me tocou de modo pessoal — o Estado interferia com o amor.’
O filme estava fadado à controvérsia, assim como o caso jurídico em que se baseava. ‘Outro dia, ouvi na TV que este é “o mais controvertido filme do ano”, mas não penso que seja discutível’, contesta Lamens. ‘Só quis mostrar às pessoas o que ainda não sabiam — por que uma esposa pede isso após 15 anos de casamento e por que o marido concorda.’
Mas talvez o mais perturbador para o público seja o próprio conceito de sadomasoquismo. O filme não se furta a mostrar as práticas do casal, desde meros amarração e açoites até experiências radicais pouco conhecidas fora da comunidade S&M. ‘Eu quis proporcionar um quadro de referência, pois eu mesmo não sabia muito de S&M’, reconhece Lamens. ‘Muitos desconhecem esse tipo de sexualidade.’

Entretanto, a questão não é se o público aprova o sadomasoquismo, mas se as práticas sexuais provadas têm a ver com a capacidade de um juiz realizar seu trabalho. Lamens é muito claro sobre o que pensa: “Criminosos de fato são libertados por causa de erros, mas adultos que se relacionam consensualmente e não prejudicam ninguém são condenados. O sistema despende muito tempo e dinheiro com certa pessoa, quando há muitas outras que não tiveram a atenção de que precisavam.’” (O privado é privado, Flanders Today, 10 de março de 2009, http://www.flanderstoday.eu/content/%E2%80%9Cprivate-private%E2%80%9D).

Atenção: este filme ainda não foi exibido no Brasil.


CINECLUBE DARCY RIBEIRO
Depois de um grande filme, sempre um bom debate

Debatedor convidado: prof. Luis Augusto Contador Borges, da Escola de Sociologia e Política de São Paulo

Data: sábado, dia 6 de outubro de 2012
Hora: 13h
Local: Sala Florestan Fernandes (r. General Jardim, 522, Casarão, próximo à estação República do metrô)

Debatendo "Leonera"

Neste sábado, a frequência foi fraca, provavelmente por causa de outras atividades que rolaram dentro e fora da Fespsp, inclusive uma tradicional viagem à cidade de Tietê.

No debate, notamos que vários temas se entrelaçam no filme: aquele de caráter detetivesco do início (afinal, quem matou o falecido?), a questão do injusto encarceramento de um eventual inocente, o ambiente das prisões femininas (prisão, em geral, é assunto "masculino"; por isso, esse filme talvez se inscreva no chamado "cinema feminista"), as relações homossexuais nessas prisões (e, claro, nas prisões masculinas também), o conflito em torno da guarda ("posse"?) da criança, etc. 

O tema das prisões especiais para grávidas ou para convívio das mães e suas crianças recém-nascidas (ou um pouco maiorzinhas) prevalece e dá o tom. Todos os outros temas — que, por si sós, já valeriam tantos outros filmes — são vistos na perspectiva de ocorrerem nesse tipo de prisão. Nessas circunstâncias, caberia o final "aberto" (com as pessoas que desembarcam em outro país indo cada qual para um lado), em que nada se resolve, ou a "solução" de todos os conflitos e de todas as relações amorosas por meio de uma fuga meio desajeitada?

Enfim, achamos o filme um tanto desequilibrado, alternando bons e maus momentos cinematográficos. A opressão do confinamento está bem resolvida, com um bom trabalho conjugado de câmera e fotografia. A sequência das mães levando as crianças para o pré-escola dentro da cadeia é excepcional. Os sinais físicos da gravidez da protagonista também: a atriz esteve de fato grávida ou foi "maquiada"? A animação da abertura também foi elogiada. Mas a presença e as ações pendulares do personagem interpretado por Santoro são inúteis ou incompreensíveis, a não ser para mostrar que todos os homens são uns canalhas. E a sequência da "rebelião" das detentas é muito pobre, talvez por causa das limitações impostas pelo fato de se filmar em ambiente real.

Como ficou observado em algumas críticas e resenhas que examinamos, "Leonera" remete a "Carandiru" (aliás, temos aqui uma coincidência da qual nem nós mesmos nos demos conta: 20 anos do Carandiru real), mas perde na comparação com o filme de Babenco. Este tópico poderia ser desenvolvido. (Frank Ferreira)